segunda-feira, 25 de julho de 2011

"Microdrama" ou "Ácida"


(Ela 1, Ele 1, Ela 2, Ele 2, todos à mesa de um restaurante japonês. Se conhecem a pouco e, por isso mesmo, são simpáticos uns aos outros).

Ele 1 (para Ela 1): E o seu marido, como vai?

Ela 1 (timidamente): Nós não estamos mais juntos...

Ele 1 (indignado): Mas por que?!

Ela 1: Eu gostaria que a gente trocasse de assunto... (para Ele 2) Bonita camisa!

Ele 2: Ah, obrigado! Eu comprei numa loja daqui, não consigo me lembrar do nome.

Ela 2 (imediatamente): Sim, sim. Se eu não me engano, estava junto com você nesse dia.

Ele 1 (resoluto): As relações têm que se manter. Ele precisa vir para cá, conhecer seus novos amigos.

Ela 1 (sorrindo amarelo): Eu gostaria de trocar de assunto, tudo bem?

Ele 2: A sua camisa também é bem bonita.

Ela 1 (aproveitando o sorriso): Obrigada, eu ganhei da minha mãe.

Ela 2: Sabe, a minha mãe não consegue me agradar, sempre troco os presentes que recebo dela.

Ele 1 (animado): Quem sabe se ele vier te visitar, se passar um tempo aqui? Quem sabe então vocês reatem?! (veemente) Uma relação não termina assim.

Ela 1 (com irritação crescente): Eu REALMENTE prefiro não falar nesse assunto.

Ela 2: Sim, há tanto que se conversar, não é mesmo?

Ele 2 (para Ele 1): Certamente, por favor, não insista.

Ele 1: Não há possibilidade de vocês voltarem? Acabou, acabou?

(Pausa. Ela 1 segura o hashi na frente do rosto. Encara Ele 1, profundamente).

Ela 1 (grave, para Ele 1): É um palito para cada olho.

(Ele 2 e Ela 2 riem nervosos)

Ele 1: Você é um tanto ácida, não?

sábado, 23 de julho de 2011

Acidinha



Era um teatro, meia hora antes da peça começar. Eu estava sozinha num banco, no café, todos os outros ocupados, e ele pediu para sentar do meu lado. Tudo bem. Eu não conhecia ninguém na plateia do Gerald Thomas. Nem ele. Carioca, professor, História. Paulista do interior, professora, Teatro.



Perguntou como fazia para chegar na Arco Verde depois da peça, expliquei conforme pude. Eu precisava mesmo tomar o ônibus na Vergueiro e talz, podia esperar por ele. Ele decidiu que ia tomar o metrô, mas se eu quisesse, desviaria um pouco do caminho, me acompanharia até o ponto, e me esperaria embarcar.



Não sei se foram os cabelos compridos, os óculos, a cara de bonachão, ou qualquer coisa insuportavelmente masculina e protetora nele, mas eu disse "tranquilo", e fui entrando no teatro. Fiquei puta com o carioca metido, mais perdido que eu, generosamente me oferecendo a garupa (nunca a dianteira) do seu cavalo branco.



Uma hora depois, finda a exibição egoico-thomasiana, saí do prédio sem correr e sem demorar. Entrei com o cu na mão no zigue-zague de ruas que me levariam ao ponto de ônibus e esperei. Pensei em tomar um táxi, em ir até Paulista e lá procurar outro ônibus, em acender mais um cigarro, e todas essas coisas que deveriam enganar o fato de ser uma mulherzinha bem pequena, sozinha, num lugar escuro.


Já em casa, demaquilada, aquecida, e com a força de mil amazonas urbanóides, me ocorreu algo tão imbecil e sincero quanto as convicções adolescentes: não há homem (mulher, criança, animal ou extraterrestre) capaz de nos poupar do que nos atravessa.

terça-feira, 19 de julho de 2011

@#$%¨&*!



Estou de férias e morando numa cidade do interior. Seria ridículo e óbvio dizer do que não há pra se fazer aqui nas férias. Em contrapartida, há pessoas, e sua inventividade. Tenho coletado frases curiosas que surgem durante nossas conversas, e acho que algumas delas merecem publicação. Para cada um dos autores, um beijo carinhoso.

1. Tudo bem se a gente "trocar" de assunto?

2. É um prá cada olho (segurando hashi).

3. Você é ácida, né?

4. Quando eu não gosto de uma pessoa, eu não gosto nem do cachorro dela.

5. Quem nunca chorou sozinho na rua?

6. É tudo mentira! É tudo mentira! É tudo mentira! (filosofando sobre o mundo e tudo quanto há)

7. Ó lá: cabecinha de novo! Hahahaha!!! (observando a interpretação inacreditável de Regina Duarte)

8. É muito difícil largar essa vida de ser vagabundo.

9. Tô cansada demais para pensar na vida.

10. Acho que vou virar sapatão de novo.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Minha nova casa nova


Me sinto em casa de novo. Tive raiva, medo, e uma vaidade – tímida o suficiente para transmutar-se em bom-senso - de superar o que havia aqui antes de mim. Domei este espaço, ou ele me domou, e agora não preciso mais buscar no google os nomes das ruas para me localizar no pequeno raio de distância no qual se resolve a vida a pé. E descobri onde comer vegetarianemente.

Entendi, até onde se pode, o mistério alheio, e com alguns deles comungo em paz. Paz. Substantivo que se repete, talvez para ocultar certa covardia ante à surpresa. Sem surpresa e sem tédio, reconheço uma certa casa como minha. A bagunça minha de cada dia, para onde volto depois do trabalho. E o trabalho mesmo deixou de ser a única razão de eu estar aqui, embora muito de mim siga orbitando por ele.

Meu sobressalto durou quatro meses incompletos, tempo suficiente para aprender o que evitar para não me aborrecer, e para onde olhar quando busco por ternura. Já há pessoas importantes demais para o exercício de minha ternura.

Com sinceridade – ainda que sempre transitória e algo desconfiada – aceito esta como minha nova morada. E um pouco menos aquela, a quilômetros daqui, onde reside boa parte do meu amor. Não por falta do mesmo amor, mas por hábito. É aqui onde preciso ajeitar os sapatos, pagar as contas, fazer as unhas. Talvez por um mecanismo de regulação biológica, começo a amar esse punhado de coisas pelas quais me reconheço e os outros vão formando sua imagem de mim.

Seja como for, percebo que tenho uma maneira meio óbvia de estar só, e ela vem sempre embalada por ColdPlay. Muda a paisagem, os objetivos, o tamanho do cabelo e até da tolerância, mas o ouvido, o que se deixa entrar por ele, é sempre mais ou menos parecido. Morre-se um pouco a cada dia, e renasce-se de quando em quando, but everything´s not lost.

Para Dalila, Hugo, Gab, Nath, Keka...