segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Lá em casa



Foi com a tia buscar os alicates de cutícula deixados para afiar. O homem atrás do balcão era um tipo falante, expansivo, simpático. Anunciou satisfeito: "Agora é só não deixar o marido usar eles pra cortar fio que duram bastante". A tia já separando o dinheiro respondeu, muito natural, como deve ser: "Lá em casa a gente não tem marido que é pra não ter esses aborrecimentos". O homem riu amarelo, constrangido dessa autossuficiência declarada. A tia não percebeu. Pagou e, de posse do pacote,  continuou o assunto com ela enquanto caminhavam de volta. Ela não prestou atenção na conversa. "Lá em casa" não era um lugar, mas as mulheres da família. Todas solteiras, uma divorciada. Os homens, ao contrário, casados a anos, mesmo que não exatamente felizes. Ela ruminando aquilo. Talvez fosse a insubordinação característica delas: todas agudas feito os alicates, e fortes. Ou sina, vai saber. Era ela também uma Pimenta. Uma tia em potencial. E os quase trinta anos ainda não davam conta de achar isso natural para si. Seria questão de tempo?

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