quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Um ano de Maringá


Ontem fez um ano que me mudei para Maringá. Vim a trabalho. O meu irmão dirigiu por oito horas, parando para ajeitar a lona que cobria algumas caixas em cima do carro. Foi tudo o que eu trouxe. O resto vendi ou doei, feliz que os amigos ficassem com coisas que ajudassem a lembrar de mim. Vim com os dois maiores companheiros que alguém pode ter, Pagu e Cartola: os gatos que me acompanham há anos e que ganharam um irmão maringaense, Otelo.
Chegamos ao fim da tarde de sábado e acampamos no apartamento enorme da Zona 07. Os planos eram organizar a vida a partir de domingo bem cedo. E essa foi a primeira grande diferença maringaense: aqui os supermercados não abrem aos domingos. Não abrem. Ponto. Ou melhor: abrem, mas só no primeiro domingo do mês.  Até hoje não aprendi a controlar a agenda de modo a desfrutar desse fenômeno.
Em compensação, às segundas, quartas e sábados tem uma fantástica feira do produtor. E o melhor: ela é noturna em dias de semana, então dá para resolver a vida durante o dia e jantar tempurá a R$4,00 na feira. O hábito de ir à feira me fez voltar a cozinhar em casa. Isso deixa feliz quem, como eu, tem um apreço hobbit pelo lar.
Aqui tem shoppings. Só na Avenida São Paulo são dois, e eu realmente passei a frequentar esse pedaço da cidade, não só pelos cinemas. Aqui tem parques e árvores para todos os lados, mas não tem centros culturais. Tem quatro edifícios teatrais, mas com programação sazonal.
Eu não tenho carro e não dirijo por convicção. Pedalo até o trabalho sem gastar mais de 15 minutos. Mesmo que não haja ciclovias e que eu tenha desenvolvido a tática de mandar beijos estalados a cada fechada ou buzinada.
Logo no primeiro mês, encontrei onde dançar, o que tornou a vida mais fácil para quem deixou uma rotina de dança e circo. Circo não tem. Tem sim, mas nenhuma escola deixa a gente subir no trapézio sem ter passado por um ano de solo. Acho que esqueceram que, para algumas pessoas, voar é mais legal.
De qualquer forma, não me lembro de trabalhar tanto. A não ser na época da graduação, quando o perrengue exigia que além dos ensaios durante o dia, eu equilibrasse bandejas à noite. Dou aulas de teoria teatral, e isso implica na equação menos atividade física, mais exercícios intelectuais, igual a pancinha e sobrepeso.
Maringaenses são bom papo: puxam conversa na fila do banco, no elevador, no consultório. Mas isso não significa que seja fácil criar vínculos. Fiz poucos amigos aqui, e os mais próximos são “forasteiros” como eu.
As pessoas se reúnem em frente à catedral nos domingos durante a tarde. Eu costumo brincar dizendo que aquele gramado é a praia maringaense. Vou lá vez ou outra, principalmente porque ali perto fica o “Vaca Louca Café Vegetariano”, que é um reduto LGBT, ciclista e vegetariano/vegano. Por mais de uma vez o “vaca” serviu para restaurar minha fé na parcela da humanidade “Deus, pátria e família”, bem característica do Paranazão.
Aqui faz um tempo nhenhenhém: é frio até que num belo dia comece a esquentar. Então chega a 32°, as vezes 34°, chove uma tempestade com granizo e no dia seguinte está frio de novo, até começar esquentar e assim por diante.
A cidade foi planejada e cada avenida entre as principais tem uma espécie de árvore plantada. Tem muito carro e pouca gente pobre porque elas foram empurradas para Sarandi, o município vizinho e com altos índices de violência. As pessoas aqui costumam se produzir. As mulheres vão ao salão de beleza antes de aos shows. E gostam mesmo de estampas de bicho: oncinhas, cobras, zebras... Tanto quanto os homens gostam de gola polo.

Eu acho graça, menos nos dias mais difíceis, mas vou indo lado a lado com um carioca que há dois meses despencou de Santa Teresa para viver Maringá comigo. 

Um comentário:

Douglas Ferreira disse...

Gosto muito da maneira como você escreve. Não nos conhecemos, mas sinto muita verdade em tudo o que diz. Não a verdade da absolutização do mundo. Mas a verdade de quem sente e escreve. Obrigado pelas palavras.