quinta-feira, 2 de julho de 2009

Sobre a normalidade


Para que se exista no mundo gozando de todos os benefícios legais a que seus administradores eleitos garantem, é necesário que se tenha um endereço localizável para que cheguem as contas e encomedas feitas com um número de CPF, que substitui rostos ou maneiras particulares de sorrir por uma função identificatória.
Um endereço também pode servir para que se convidem pessoas, para não apanhar chuva, para que se ter preguiça ou como esconderijo.
Numa rua há sempre casas e nas casas, os outros. Eles são maioria e, sendo assim, ditam as regras da normalidade e as obedecem de bom grado ao assistirem à TV no domingo e rirem dos pequenos acidentes flagrados por câmeras caseiras tão periodicamente quanto se houvessem placas avisando quando rir e quando cessar o riso.
Torcer por times de futebol, contar piadas sobre minorias, fazer sexo ensaiado e aos berros, como a TV diz que deve ser quando se está contente e , acima de tudo, fazer muito barulho também são ações muitíssimo apropriadas ao sentimento de coletividade, essencial para um bom convívio entre vizinhos.
Não gostar de futebol, nem de programas dominicais, nem permitir que a subjetividade seja adestrada, e - absurdo dos absurdos! - se incomodar com o som da alegria alheia, certamente configura um comportamento inadequado, grosseiro e, por fim, inimigo. E, para essas pessoas, que são maioria no mundo, não há outra maneira de lidar com um inimigo que não combatendo-o.
Obviamente, este tipo de combate não tem eficiência se travado com argumentações visando a acordos, porque essas são ferramentas em desuso, além, é claro, de serem subterfúgios de gente frouxa.
E no caso de se estar lidando com gente frouxa, é uma estratégia muito eficaz deixar claro que seus intereses não são partilhados com a comunidade em que esta (não) se insere. E, se ainda asim houver insistência em atitudes que destoem do todo, recomenda-se que se formem bandos e, como uma manada, se instalem no caminho desse indivíduo metido a besta da maneira mais intimidadora possível.
Esta sim, e uma estratégia altamente eficiente: uma vez que sua inclinação seja refletir, se conseguirá que esta gente fouxa e metida a besta passe uma tarde inteira pensando sobre sua função no mundo e, com sorte, pode-se mesmo conseguir com que se deprima ao constatar sua insignificante força de expressão mediante à imbecilidade reinante o que, certamente diminuirá sua potência de contestação ao menos temporariamente.

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