sábado, 22 de janeiro de 2011

Baile

eu te exijo
com os olhos
sutilmente
e se você
me devolve
o olhar
acha mesmo
(até jura)
que essa exigência
está
não nos meus
olhos
mas no que
há de
mais urgente
em si

sábado, 15 de janeiro de 2011

Introdução ao segundo capítulo

Há hoje um consenso sobre inserção dos meios de comunicação de massa nos aspectos mais generalizados da vida, incluindo aqueles que se relacionam aos nossos valores e subjetividade. Os media detém a disposição de toda produção sígnica inerente ao homem. Eles passaram a regular a veiculação, criação e a legitimação da cultura. Não, claro, sem se expor a uma espécie de caos e imprevisibilidade daqueles conteúdos que não se deixam captar facilmente.

Conforme pontuado por Lypovetsky (2010), a cultura tornou-se moeda, e seu valor de troca é algo com que os Estados passam a se ocupar cada vez mais, dado que, também dela, depende sua hegemonia. Sob este ponto de vista, a cultura travestiu-se em “cultura-mundo[1]”.

Porém, longe de ser irreversível ou impossível de transpor, mesmo lançando mão de mecanismos que alcançam e saturam nossa percepção, a cultura-mundo tem sofrido interferências substanciais ao longo dos anos. Alguns exemplos estão na autonomia dos artistas, na criação de redes informais, e em sua resistência a um modo de organização que congrega mídia, arte e mercado. Estas são posturas que funcionam como uma espécie de ruído paralelo e desestabilizador.

Tratam-se, segundo Santos (2010), de emancipações sociais (no plural, porque diferentes umas das outras), que prevêem igualdade em operações cuja diferença pretende nos inferiorizar; e diferença, quando a igualdade tem por objetivo nos descaracterizar. O poder revolucionário da arte residiria em sua colaboração com este projeto[2].

Neste panorama, passamos entender a arte, e em especial a performance, como um fenômeno sobretudo comunicacional. Nos interessa sua habilidade em tecer conexões entre seus pares e, a partir destas conexões, produzir diferenças e igualdades em lugares e lógicas estabelecidos.

A partir deste deslocamento, nos debruçamos sobre o tema e, mais especificamente, sobre o trabalho de determinados artistas escolhidos, inegavelmente, segundo alguma afinidade estética ou de discurso. Todavia, estamos considerando também as estratégias que tais trabalhos utilizam para assegurar sua subsistência. A série “Estranho, um cara comum”, do performer Flávio Rabelo tem indícios do tipo de comunicação cara a esta pesquisa.




[1] Cultura-mundo significa fim da heterogeneidade tradicional da esfera cultural e universalização da cultura mercantil, que se apodera das esferas da vida social, dos modos de existência e da quase totalidade das actividades humanas. Com a cultura-mundo, alastra-se por todo o globo a cultura da tecnociência, do mercado, dos media, do consumo e do indivíduo com ela toda uma série de novos problemas, não só de âmbito global (ecologia, imigrações, crise económica, miséria do terceiro mundo, terrorismo, etc.), mas também existenciais. A cultura globalitária não é apenas um facto, mas, ao mesmo tempo, um interrogação profunda e inquieta sobre si mesma. É o mundo que se transforma em cultura e a cultura em mundo: é uma cultura-mundo (LYPOVETSKY, 2010, pp. 13-14).

[2] Trecho retirado de entrevista com o autor no site “O Globo”. A versão integral pode ser lida em: http://oglobo.globo.com/blogs/prosa/posts/2010/07/23/boaventura-de-sousa-santos-fala-sobre-rap-global-310530.asp. Acessado em 12/01/2011