quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Desfrute - ação realizada durante o VIII Festival de Apartamento (São Carlos - SP).

Há um círculo do palpado e do palpante, o palpado apreende o palpante; há um círculo do visível e do vidente, o vidente não existe sem a existência do visível; há até mesmo a inscrição do palpante no visível, do vidente no tangível e reciprocamente; há, enfim, propagação dessas trocas para todos os corpos do mesmo tipo e do mesmo estilo que vejo e toco - e isso pela fundamental fissão ou segregação do sentiente e do sensível, que, lateralmente, faz os órgão de meu corpo entrarem em comunicação, fundando a transitivi
dade de um corpo a outro (Merleau-Ponty. O Visível e o Invisível:139. 1971).
Fotos: Alexandre Sanches, Murilo de Paula e Ludmila Castanheira




terça-feira, 14 de setembro de 2010

O começo


Primeira página da minha pesquisa... Espremida, cutucada.





Introdução de tudo

O tema desta pesquisa é a performance tratada como meio de comunicação. Escolher tratá-la dessa maneira parte da constatação de que determinados circuitos artísticos precisam se valer de algumas brechas (comunicacionais, mercadológicas, curatoriais) coexistentes a um modo de organização hegemônico para se sustentar. Neste exercício, estes circuitos acabam por estabelecer, eles mesmos, os canais necessários à sua fruição.

Este comportamento nas artes, além de implicar em conseqüências políticas, parece dividir, senão deslocar, a importância da obra de seu resultado para o percurso, troca e alterações às quais está sujeita em sua veiculação no meio.

As manifestações que realizam seus próprios canais não são sempre artísticas, nem estamos afirmando que fazê-lo seja característico de toda e qualquer ação performativa. Desde já, é preciso esclarecer que nosso discurso se firma na delimitação de ações performativas que, a nosso ver, apresentam este caráter.

O conjunto de práticas compreendidas como artes presenciais (e que aqui estamos considerando dança, performance e teatro) têm a propriedade de acontecer em negociação com público, havendo maior ou menor abertura para sua entrada. Porém, por menor que seja o vetor entre obra e público, não se pode repeti-la sem que sem que haja modificações.

Ao menos nas primeiras experiências da performance, o apelo e destaque ao “irrepetível”, entre outras propostas de experimentação, buscavam compreendê-la como acontecimento[1]: ação que faz algo (materiais, tempo, espaço, público, performer) passar de um estado (material, de humor) a outro.

Neste viés, a performance se apropriou, sem distinção, das várias contribuições das vanguardas, bem como retomou antigos rituais. As informações advindas da própria arte, do cotidiano e da biografia do artista se processaram de forma a traçar o que viria a ser, ainda hoje, uma arte em construção.

Ainda assim, e talvez até em resposta à perda dos parâmetros que tinham por função situá-la e caracterizá-la, observa-se um modo de fazer, apreciar e difundir arte que se pretende dominante. Mesmo entre artistas, há a eleição das obras que são de bom tom prestigiar, e as quais são uma falta grave que não se tenha visto, ouvido, participado. Este modo, que se perpetua em cadernos, revistas e sites especializados, através do estabelecimento de certa identidade[2], desconsidera ou procura diminuir qualquer outro que não seja ele próprio.



[1] Em distintas bibliografias, situa-se o happening (acontecimento) em oposição à performance, sendo que o primeiro seria uma versão menos elaborada ou mais espontânea da segunda. O hapening, para alguns autores, teria sido a forma de experimentação que, decantada, daria lugar à performance, resultado da maturação da obra e do artista. Thaíse Nardim, em “Allan Kaprow, performance e colaboração: estratégias para abraçar a vida como potência criativa”, oferece uma interessante visão sobre o hapening como forma artística autônoma e organizada.

[2] A definição é a descrição de uma identidade distinta de outras identidades e aspira delimitá-las de forma não-contraditória. A definição nos exclui enquanto sujeitos ativos. A fragmentação – se entendida no sentido de blocos duros não comunicáveis – é fundamental para o pensamento identitário, elemento básico para a organização social capitalista que sublinha sua importância. A identidade é a antítese do reconhecimento mútuo, da comunidade, da amizade e do amor (OLIVEIRA, 2007, p. 62).