Ontem fez um ano que me mudei para
Maringá. Vim a trabalho. O meu irmão dirigiu por oito horas, parando para
ajeitar a lona que cobria algumas caixas em cima do carro. Foi tudo o que eu
trouxe. O resto vendi ou doei, feliz que os amigos ficassem com coisas que
ajudassem a lembrar de mim. Vim com os dois maiores companheiros que alguém
pode ter, Pagu e Cartola: os gatos que me acompanham há anos e que ganharam um
irmão maringaense, Otelo.
Chegamos ao fim da tarde de sábado e
acampamos no apartamento enorme da Zona 07. Os planos eram organizar a vida a
partir de domingo bem cedo. E essa foi a primeira grande diferença maringaense:
aqui os supermercados não abrem aos domingos. Não abrem. Ponto. Ou melhor:
abrem, mas só no primeiro domingo do mês.
Até hoje não aprendi a controlar a agenda de modo a desfrutar desse
fenômeno.
Em compensação, às segundas, quartas e
sábados tem uma fantástica feira do produtor. E o melhor: ela é noturna em dias
de semana, então dá para resolver a vida durante o dia e jantar tempurá a
R$4,00 na feira. O hábito de ir à feira me fez voltar a cozinhar em casa. Isso
deixa feliz quem, como eu, tem um apreço hobbit pelo lar.
Aqui tem shoppings. Só na Avenida São
Paulo são dois, e eu realmente passei a frequentar esse pedaço da cidade, não
só pelos cinemas. Aqui tem parques e árvores para todos os lados, mas não tem
centros culturais. Tem quatro edifícios teatrais, mas com programação sazonal.
Eu não tenho carro e não dirijo por convicção.
Pedalo até o trabalho sem gastar mais de 15 minutos. Mesmo que não haja
ciclovias e que eu tenha desenvolvido a tática de mandar beijos estalados a
cada fechada ou buzinada.
Logo no primeiro mês, encontrei onde
dançar, o que tornou a vida mais fácil para quem deixou uma rotina de dança e
circo. Circo não tem. Tem sim, mas nenhuma escola deixa a gente subir no
trapézio sem ter passado por um ano de solo. Acho que esqueceram que, para
algumas pessoas, voar é mais legal.
De qualquer forma, não me lembro de
trabalhar tanto. A não ser na época da graduação, quando o perrengue exigia que
além dos ensaios durante o dia, eu equilibrasse bandejas à noite. Dou aulas de teoria
teatral, e isso implica na equação menos atividade física, mais exercícios
intelectuais, igual a pancinha e sobrepeso.
Maringaenses são bom papo: puxam
conversa na fila do banco, no elevador, no consultório. Mas isso não significa
que seja fácil criar vínculos. Fiz poucos amigos aqui, e os mais próximos são “forasteiros”
como eu.
As pessoas se reúnem em frente à
catedral nos domingos durante a tarde. Eu costumo brincar dizendo que aquele
gramado é a praia maringaense. Vou lá vez ou outra, principalmente porque ali
perto fica o “Vaca Louca Café Vegetariano”, que é um reduto LGBT, ciclista e
vegetariano/vegano. Por mais de uma vez o “vaca” serviu para restaurar minha fé
na parcela da humanidade “Deus, pátria e família”, bem característica do
Paranazão.
Aqui faz um tempo nhenhenhém: é frio até
que num belo dia comece a esquentar. Então chega a 32°, as vezes 34°, chove uma
tempestade com granizo e no dia seguinte está frio de novo, até começar
esquentar e assim por diante.
A cidade foi planejada e cada avenida
entre as principais tem uma espécie de árvore plantada. Tem muito carro e pouca
gente pobre porque elas foram empurradas para Sarandi, o município vizinho e
com altos índices de violência. As pessoas aqui costumam se produzir. As
mulheres vão ao salão de beleza antes de aos shows. E gostam mesmo de estampas
de bicho: oncinhas, cobras, zebras... Tanto quanto os homens gostam de gola
polo.
Eu acho graça, menos nos dias mais
difíceis, mas vou indo lado a lado com um carioca que há dois meses despencou
de Santa Teresa para viver Maringá comigo.